domingo, 19 de dezembro de 2010

Cai o pano.




“Nós ficaremos em cartaz aqui, sempre de quarta à domingo, às 19h. até o dia 19 de dezembro. Se gostaram, por favor, indiquem, se não gostaram não precisa nem dizer que saiu de casa!” E assim, de quarta a domingo, encerrávamos o espetáculo A Garota do Biquíni Vermelho. 

E dia 19 de dezembro se fez presente. O dia do fim chegou. A frase final teve que ser mudada, afinal, não terá mais espetáculo de quarta a domingo. Quem viu, viu. Quem não viu, por sua vez, não viu. E nós encerramos o nosso expediente no teatro Sesc Ginástico. 

Durante os ensaios fortes emoções me acometeram. Teste, assalto, conjuntivite. Durante dois meses de temporada tivemos de um tudo. Atrizes doentes, desavenças, algumas fofocas, um tanto de preguiça, um bocado de amizade. Algum amor e um pouco de ódio pra temperar. Por vezes desejei a chegada desta presente data, devido ao meu cansaço, devido à muita coisa que, por hora, prefiro digerir e manter comigo ao invés de publicar. Mas com a data do fim vem junto, como não podia deixar de ser, uma sensação de vazio e, ao mesmo tempo, de dever cumprido. Finda-se esse ciclo. Mais um que se encerra na minha vida. No exato momento em que um buraco se abre sob meu pés, um caminho se abre diante dos meus olhos. Ando a aprender que ciclos se encerram pra que outros comecem. O meu se encerra hoje, junto com o fim do ano, junto com o fim de uma década.

Mas antes de ele se encerrar muitas coisas aconteceram. Coisas nada relevantes. La no inicio eu aprendi a me relacionar com uma diva. Mais do que isso, eu fui dirigida por uma diva. Marília Pêra. Na minha boca foi colocado o texto de Artur Xexéo (que na data de hoje publicou um texto lindíssimo sobre a gente , sem esquecer de niguém: http://oglobo.globo.com/cultura/xexeo/posts/2010/12/19/adeus-garota-349433.asp.) Na plateia me assistindo e me aplaudindo no final nomes como: Regina Duarte, Miguel Falabella, Arlete Sales, Claudio Botelho, Sérgio Britto, Ney Latorraca, Antônio Fagundes, algumas de nossas queridas vedetes e por último, mas não menos importante, Fernanda Montenegro. Entres outros, que não terei a capacidade de me recordar de cada um.  Mas isso tudo passou muito longe do dito Glamour.

Trabalhamos incansavelmente de segunda a segunda, durante os ensaios e 5 vezes por semana durante a temporada. Porque o glamour pode estar nas revistas, mas na vida real o buraco é bem mais embaixo. Estamos expostos o tempo todo, sujeitos a qualquer tipo de olhar, mexemos com nossas emoções todos os dias, precisamos estar sempre com saúde mental e física pra um bom resultado, improvisar caso aconteça algo que não estava no script, relevar qualquer coisa de destrutiva que possa ser dita, e se cair, levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima.

Ufa! 

E eu não poderia deixar jamais de dizer que nesse trabalho eu fiz amizades que levarei comigo para todo o sempre. Conheci e reconheci pessoas incríveis que eu considero agora parte da minha família carioca. Amei muito cada um deles, me apaixonei muito por todos eles. Todos os que dividiram cena comigo e todos os que ficaram atrás das cortinas se desdobrando em mil pra que estivéssemos lindas no salto. Amei muito todos. Mas uma pessoa em especial.

Meu pai bem me mandou estudar pra ser médica. Mas mal sabe ele que eu estudo todos os dias pra continuar vivendo e sobrevivendo da profissão que eu escolhi.

Agora que acabou, acabou. E se acabou é porque vem outras coisas pela frente. E é só mais um dos ciclos que começaram e se encerraram esse ano pra mim. Eu tenho vontade de chorar. E eu choro. Porque meu ascendente Escorpião é agua. E eu sou filha de Iemanjá. Muita água vai desabar ainda desses olhos. Acostumem-se ou abandonem-me.

Entrando em 2011 sem trabalho, sem casa, mas com muita esperança no coração.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Todo fim.




Todo fim de ano é assim. A gente fica meio assim. Meio triste. Meio saudosista. Meio feliz sem ter razão. 

Um aperto no peito. Uma vontade de chorar. Só por chorar. Um medo. Algumas incertezas. Nenhuma certeza. 

De onde vim? Pra onde vou? Com quem eu vou? Me tira daqui. 

Um excesso de emoção. Uma ausência de palavras. E muita coisa que não cabe na gente. 

Sem mais. 

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Mais uma vez.


E mais uma vez amor
Nossa história chega ao fim
A saudade já não dói amor
Então não me olha assim

Porque hoje o dia decidiu mudar
Nasceu assim azulzinho
Não levou essa vontade de chorar
Mas já conhecemos o caminho

E mais uma vez amor
Nossa ilusão chega ao fim
É tudo tão complicado amor
Mas eu te gosto ainda assim

Tá tão quieto esse violão
Meia hora pro dia nascer
Mas não tem nada não
Eu ainda acho graça de você
Você e seus velhos amores
Eu e a promessa não cumprida
Você na casa das flores
Eu procuro a Ilha Desconhecida

E mais uma vez amor
Nosso pouco amor chega ao fim
Não vou mentir amor
Você não cabe mais em mim.


(Se preparar pra mudar de casa tem dessas coisas. Velhos bilhetes, velhas canções, fotos antigas ressurgem. Pra remexer nesse resquícios é preciso estar bem alimentado e com a cabeça no lugar. Vem mais por aí...)

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Hino da revolta.



Quem foi que disse que o cabelo tem que ser liso. Que não é bom andar descalço. Que o marido tem que ser rico?

Quem foi que disse que a atriz tem que ser global. Que o peito tem que ter silicone. Que o Rock tem que ser metal?

Quem foi que disse que a vó tem que fazer crochê. Que menina tem que namorar menino. Que o filho tem que parecer você?

Quem foi que disse que a roupa tem que ser de marca. Que só o santo faz milagre. Que manga com leite mata?

Quem foi que disse que saudade um dia tem fim. Que o batom tem que ser vermelho. Que entorpecente é ruim?

Quem foi que disse que não gostar de chorinho é pecado. Que dois é melhor que um. Que o príncipe tem que ser encantado?

Quem foi que disse que Deus irá ajudar a quem cedo madrugar. Que tamanho é documento. Que ser é melhor que estar? 

Quem foi que disse que todo filme do Woody é genial. Que o legal é não comer carne. Que é verdade tudo o que diz o jornal?

Quem foi que disse que caráter é definido pelo sexo ou cor. Que diploma é indispensável. Que ser educado é um favor? 

Quem foi que disse que é fácil dizer não. Que a idéia tem que ser brilhante. Que mil amigos no facebook é antônimo de solidão?

Quem foi que disse que bonita é a magreza. Que os dias tem que ser de sol. Que mulher não põe o pau na mesa?


quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Pra sempre.


Eu não me lembro com exatidão do momento em que deixei de acreditar em Papai Noel. Também não me recordo de quando entendi que heróis eram feitos apenas de excesso de imaginação. Mas sei do dia, hora e minuto em que compreendi que nada, absolutamente nada, dura pra sempre. Ontem, exatamente ontem, um click me abriu os olhos ao mesmo tempo que os encheu de água. Nada dura pra sempre. Não atuarei na minha profissão para todo o sempre. Ela me decepciona, na maioria das vezes. Não serei capaz de amar alguém pra sempre, ao passo que também não serei amada pra sempre. Nem mesmo pela minha mãe. Porque um dia, não mais que de repente, ela será levada desse mundo, e como desconheço o mundo do lado de lá e nem sei sequer se de fato ele existe, muito provavelmente ela ficará apenas na memória. E memórias não amam. Muito menos pra sempre. A própria memória um dia se esvairá. Se desbotará aos poucos até sumir pra sempre. Minha beleza durará apenas mais alguns anos. Meus livros preferidos serão comidos por traças. Meus cds, que contam pedaços da minha história através de fotos e vídeos ali gravados, um dia serão lixo reciclável. Minhas palavras serão esquecidas.  Meus amores já têm outros amores. Porque não seria imortal posto que é chama. Minhas músicas não atravessarão gerações. Minha casa precisa ser outra. E assim por diante. Um dia eu cheguei sim a acreditar que tudo era pra sempre. E não faz muito tempo. E eu era feliz assim. O que eu não sabia era que o pra sempre sempre acaba. Mas está tudo bem. Meu medo não será pra sempre e eu também não vou durar pra sempre. E quando o fim da minha estrada chegar nada disso terá mais importância. 




segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Saudade.


- O BOM DA SAUDADE É MATAR!!

- TEM SAUDADE, ÀS VEZES, QUE NEM MATANDO...


sábado, 13 de novembro de 2010

Amar é...




Um dia ela me olhou com aqueles olhos azuis de safira e perguntou minha idade. 18, disse eu. Ela sorriu, meio amarguradamente, dizendo: “eu tenho 28, dez a mais que você. Aproveite enquanto você ainda tem a capacidade absoluta de amar. Amar pura e incondicionalmente. Ao longo do tempo você vai passando por coisas e sua forma de aplicar o amor vai mudando. Quando você chegar à minha idade você vai ver viver o amor de maneira diferente”.

Dez anos se passaram e eu cheguei à idade dela. E ela tinha toda razão. Ou não. Amar aos 18 é achar que aquela pessoa é amor pra vida inteira, pra ter netos e passar os últimos dias da vida na varanda da casa, cada qual em sua cadeira de balanço. É não conseguir se imaginar sem a razão da sua inspiração pra escrever cartas ou passar um fim de semana inteiro chorando porque foi obrigada a viajar com os pais deixando o ser amado pra trás. Amar aos 28 é saber que o buraco é muito mais embaixo e que, provavelmente, se teve começo terá fim. E, que não necessariamente isso seja melhor ou pior. A razão de minha colega de questões amorosas de 10 anos atrás mora na sua colocação de que, com o passar do tempo, vamos transformando a maneira de aplicar nosso amor. Me perguntei  e te perguntei outro dia se eu de fato amo ou se é só uma ilusão produzida pelo meu coração a partir de uma solidão momentânea. Será que amamos uma única vez na vida, antes dos 18 até, e a partir disso tudo é apenas uma tentativa de reviver ou esquecer ou substituir aquilo? Rodriguianamente falando, se acaba é porque não era amor. Já o poetinha escreveu as mais comoventes e belas poesias sobre o amor, mas se casou diversas vezes. Se pra toda regra existe uma exceção, pra cada amor existe uma regra. E pra cada uma dessas regras existe um amor. Antes fosse tipo receita de bolo. Mas por enquanto, a gente vai vivendo 18, 28, 58, 98 anos tentando entender e viver e sobreviver ao amor.

sábado, 6 de novembro de 2010

Um, dois, três, testando.

 

Até quando serei testada? Até quando serei posta à prova? Até onde precisarei ser examinada?  

É normal se sentir um camundongo branco de laboratório? Como se você fosse eterna e diariamente testada pra continuar sobrevivendo na sociedade? Pra conseguir um trabalho minutos ou dias de testes de habilidade e beleza. Pra se relacionar alguns dias ou semanas de test drive. Pra alugar alguns metros quadrados de teto pra morar uma meia dúzia de comprovantes. Pra ser aceito nas rodas de amigos uma ou outra piada seguida de uma lambida de saco. Diploma? Só depois de responder as 1.348.294 perguntas.

Abre a boca, coloca a língua pra fora e diga AAAAAAAAAAAHH! Diga trinta e três. Coloca o pé direito nas costas. Sabe cantar? Tem alergia a algum medicamento? Tem problema de vista? Improvisa essa cena.  Dança? Anda à cavalo? Fala javanês? Leu o horóscopo hoje? Estica as pernas e mais tônus no abdômen. Comprovante de renda, por favor. É hetero? Prefere chocolate preto ou branco? Usa-se os talheres na ordem de fora pra dentro. Não ande descalça, é falta de higiene. Testeee. Som. 1, 2, 3, som. Sssssom. 

Não é bonita o suficiente. Alta de mais. Alongada de menos. Sotaque sulista não rola. Botafogo não é um bairro bom. Renda insuficiente. Passou o prazo. Cachos de mais. Peitos de menos. Não sorria tanto.   Dentes demais. Fala mais baixo que isso aqui não é teatro.  

Segura a claquete. Tati Pasquali. 28 anos. 1,68m. Sorria. Vira pro lado direito. Vira pro lado esquerdo. Da uma volta completa. Da o texto pra essa parede. Corta! Valeu! A gente entra em contato. 




segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Por onde andará?


Ela anda largada às traças. Eu já gritei, mas ela insiste em não ouvir. Ficou surda. Voz então ela nem se lembra mais se era soprano ou cicrano. Os dois olhos negros ela pisca com força e faz bico. Dá de ombros pra minha impaciência. Bate o pé no chão feito criança. Consegue, por mais incrível que pareça, ser mais teimosa que a mim. Ela senta na minha frente, num canto qualquer, e me olha como se fôssemos duas entranhas. Quando eu tento puxar um assunto ela a mostra língua, sai correndo, pára, faz uma banana pra mim e morre de rir. Quando eu acho que ela vai dar o ar da graça ela boceja na minha cara e pega num sono profundo. Não quer saber de mim. Ela não gosta mais de mim. Mal sabe a tipa que dela preciso. Que minha sanidade mental e psicossomática dela dependem. Desaforada. Ah! Se eu vir por aí, rondando meu quarto e me provocando pra depois sair fugida pelo ladrão, eu a pego pelo braço, a coloco no colo e dou palmadas até ela pedir água e prometer que vai coloborar. Safada. Mas você vai voltar que eu bem sei. Mas vê se não fode meu pavil que de curto já quase explodiu. Até rimou. Viu? Ei? Ficou orgulhosa? Inspiração??? Por onde andará a porra da minha inspiração???? 

domingo, 17 de outubro de 2010

A gente é humano.


Meu filho, o mundo é da gente.

A gente corrompe, suborna. Renega a própria família. A gente assassina pais de família friamente. A gente bate em mulheres. A gente não tolera gays, travestis ou coisas do gênero. A gente espanca, mata, mutila. A gente invade casas. Faz reféns, tortura inocentes. A gente assalta velhinhas na rua. Coloca fogo em índio. A gente atira primeiro e pergunta depois. A gente rouba dos pobres. Vende a merenda das escolas públicas. A gente deixa pessoas morrerem na porta dos nossos hospitais. A gente rouba as bolsas dos pedestres. E eles que levantem as mãos pro céu e agradeçam se saírem ilesos. A gente faz dos nossos carros verdadeiras armas. A gente chuta bengala de deficiente físico. A gente desvia dinheiro. Engana as pessoas. As meninas indefesas a gente faz mulher a força. A gente espanca nossos filhos. Alguns até a morte. A gente faz arrastão, espalhando medo pelas ruas. Até avião a gente rouba, pra depois jogar em cima da cabeça de todo mundo. A gente coloca nossos filhos pra pedir esmola até altas horas da noite. Descalços. E se quiserem comer vão ter que pedir pra alguém. A gente violenta nossas crianças. A gente vende o corpo pra encher o cu de droga. A gente mora na rua e fede que nem gado. Que nem bicho. A gente ganha salário pra proteger a população, mas a população tem mais medo do que confiança na gente. A gente tem muita grana, mas quer mais. A gente mente. E muito. A gente é cruel. A gente traumatiza pessoas. Faz tortura psicológica. Xinga pai e mãe. Cospe na cara dos nossos avós. A gente não trabalha, mas ganha. A gente deixa milhões de pessoas morrerem de fome. A gente não ensina nossas crianças a ler e escrever. A gente tem identidade falsa. A gente finge que é médico e mutila pessoas. Vende drogas. Usa drogas. Rouba da própria casa. Depois da missa a gente peca. Mas reza dez pai-nossos e dez ave-marias. A gente judia dos bichos. Taca fogo em rabo de gato, abandona cachorro na rua, espeta touros. A gente escraviza. A gente trai, chifra, passa a perna. Vai na ferida. Denigre a imagem das pessoas. A gente pede esmola e se ganha comida a gente joga no chão. A gente sequestra. A gente assalta bancos. A gente usa pessoas como escudo. Casamentos e amizades a gente destrói. A gente arrasta crianças pelo asfalto, esquarteja amantes, mata nossos pais, prende nossas filhas e netos em cativeiro por anos, a gente atira nas crianças dentro das escolas.

É nesse mundo que você quer viver, meu filho? Não vai. Porque a gente mata os bebês que moram dentro da gente.