terça-feira, 20 de novembro de 2012

A Ditadura do Amor



Amar virou fácil. Se fosse mais magro, menos alto, mais falante. Ama o corpo e odeia os hábitos. Gosta do hálito, mas a saia é muito curta. E devolve meu coração, que ele bate num ritmo diferente da batida da pista. Apenas seja feliz comigo.

Não fume. Não cante fora do tom. Desça do salto. Devolve a cópia da minha chave. Fale menos. Sorria menos. Ganhe mais. Solte os cabelos. Não me prenda. Use os talheres de fora pra dentro. Ouça mais ópera. Veja menos novela. Sonhe mais. Pense menos. E seja feliz comigo.

As coisas não são assim. Frango só assado. Coloca o cinto de segurança. Controle o remoto. Salgue menos a comida que eu adoço a bebida enquanto a gente escolhe o nome do cachorro. Vermelho não lhe cai bem. Liga o ar condicionado no máximo. Fecha a janela e abre meu zíper. E seja feliz comigo.

Monte seu guarda-roupas e desmonte essa cara. Lave a louça de ontem. Não bata o cigarro no chão. Ligue a seta e mantenha a esquerda. Endireita o colarinho. Beba. Me coma. Não esquece meu presente. Não fale com estranhos. E seja feliz comigo.

Não com os outros. Não na dispensa. Não na rua. Às vezes no elevador. Nunca na varanda. Muito menos em rede nacional. Apenas comigo. No domingo. Seja feliz comigo.




segunda-feira, 30 de julho de 2012

Mais tempo.



O Homem-de-Lata pede coração, o Espantalho quer um cérebro, o Leão precisa de coragem e a Dorothy não vê a hora de voltar pra casa. Se eles tivessem me encontrado no meio do caminho da estrada de tijolos amarelos na direção do Mágico, eu teria ido até o destino dessas personagens pra pedir... Mais tempo! 

Mais tempo pra viver as risadas. Mais tempo pra viver os amores, mesmo que nas suas formas mínimas. Mais tempo pra conhecer o mundo e outros mundos. Mais tempo pra dançar. Mais tempo pra chorar. Mais tempo pra dormir. Mais tempo pra conhecer gente e pra essa gente me conhecer.

30 anos se passaram e minha pele guarda o que minha memória não pode alcançar. Se existem 7 bilhoes de pessoas no mundo, quantas podemos conhecer até o final de nossas vidas? Se existem 200 países, em quantos vamos pisar? Se existem 100.000.000.000 de galáxias no universo, quantas delas nossos olhos vão registrar através da luneta? Isso sem falar nas verdades e mentiras, nos mitos, nas piadas e nas bobagens que não vamos desvendar e nem presenciar por simples falta de tempo! 

Quero mais horas no meu dia e mais dias nas minhas horas, mais amor no meu sexo e mais vida no meu amor. Mais minutos pra memória não se perder, mais lembrança na saudade, mais refeições para mais companhias. Mais tempo pra ser loira, vermelha ou preta. Mais tempo pra amar mais gente e odiar outras tantas e/ou ser amada e desprezada por poucas ou muitas. Mais tempo pra reclamar da conta que eu atrasei ou pra comemorar um chute no gol. Mais tempo pra representar e pra dizer meia dúzia de verdades. Mais tempo pra ver o tempo passar. 

Se eu não gosto de fígado acebolado e idolatro chocolate é pura falta de tempo de experimentar outros sabores até decidir ou não decidir qual preferir pro resto da minha vida que, por sua vez, teria um tempo maior.  

Mais tempo pra não ter tempo.

Mais tempo! Mais tempo!

E não me venha com míseros minutos que a minha paciência é atemporal.


sexta-feira, 13 de julho de 2012

Fim do (meu) mundo.




Poucas ou muitas pessoas sabem. Poucas talvez viram. Muitas com certeza já ouviram falar. Eu não vejo a menor graça em voar. Sim, eu tenho medo de avião. Tenho medo que o mundo finde no ar. Que o meu mundo acabe no ar. Ou no chão. Ou no mar. Todas as vezes em que me encontro a milhas e milhas do solo e pra distrair meu pânico, eu penso na vida que eu não vivi. No filho que eu não gerei. No segundo que eu não adotei. Na música que eu não dancei. Ou na que eu gostaria de dançar novamente. Nas minhas rugas que ainda não amadureceram. Penso que não! Aquela não pode ter sido a última vez que vi meus amigos. A última vez que abracei minha família. A última vez que vi o dia nascer na turva embriaguez. Eu me viro e vejo que na cadeira ao lado do avião não existe um amor em forma de pessoa pra mim. Então, num descuido, eu me vejo abraçando e chorando e declarando meu amor a um desconhecido de cabeça chata. Só pra não me sentir sozinha e desamada no meu fim do mundo. No fim do meu mundo. A morte deve ser alguma coisa muito perto da solidão absoluta. Pode se morrer junto com uma multidão, ou sozinho, mas cercado de gente. Seja como for, a morte sempre me pareceu algo muito pessoal, solitário e egoísta. Morrer deve ser um abismo sem fim na direção do vazio.

Eu tenho certeza absoluta que minha existência nessa existência não acabará dentro de uma caixa em formato fálico com asas, feita de ferro e plástico e pesando toneladas que (ultrapassando a minha inteligência) voa distancias em minutos. Mas a certeza de onde e quando e como eu vou nascer em outra dimensão, essa eu não tenho. Ignoro. Não vejo. E juro. Não penso. O único momento da minha vida em que me questiono sobre isso é quando estou voando. Não sei se porque fico mais perto do céu. Não sei se porque não consigo dormir. Não sei se porque não tenho nada a fazer. Ou se isso se trata simplesmente de medo. Então o medo se concretiza pra mim em forma de uma cadeira vazia que deixarei na mesa do jantar. Medo de deixar de existir. Hoje eu sou um ser único. Com características únicas. Físicas. Pessoais. Emocionais. Um dia eu me tornarei o que todo mundo se tornará: um saco de ossos e carne. Sem vida. Sem alma. Pra todo o sempre. Existirei apenas na lembrança de alguns até que se finde também o mundo desses. Então sou pessoa que se tornará saudade até virar esquecimento.

E você também.



sexta-feira, 13 de abril de 2012

Final feliz?



Final de novela tem o quê? Um casamento. Ou mais. Um filho, que descobre que na verdade não é filho do pai. Uma gravidez. Às vezes várias. Um vilão que morre. Ou foge. Ou acaba lavando chão em lanchonete de beira de estrada. Um novo beijo. Um novo amor. Ou o retorno de um amor antigo.

De uma forma ou de outra é sempre um final feliz. Pelo menos pra grande maioria merecedora. Então eu fico me perguntando se depois de 7 anos os finais felizes ainda continuam felizes. Se os casais ainda se amam, se tiveram filhos lindos e se progrediram financeiramente. Ou se ela engordou 200 Kg e ele ficou brocha, logo depois de o apartamento ter ido à leilão na Caixa Econômica.  

Então não existem finais. Os finais só chegam quando acaba a vida. Final feliz de novela na verdade não é um final e sim um começo. Deveria se chamar começo feliz. Começo de um ciclo. Começo numa vida a dois. Começo num trabalho novo. Porque o final ainda está longe de acontecer. E começos são sempre felizes, os finais de fato é que nem sempre são. 

Assim eu desejo aos meus amados e (por que não?) à mim também um começo feliz. E que esse começo dure o quanto durar mas que seja sempre feliz.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Pra não dizer que não falei dela.


Na minha janela, um presente da última visita de minha mãe. Um vaso de flor. Não sei qual o nome. Mas se parece muito com alguma que já vi em algum momento ou em algum lugar. Ou as duas coisas. Mas o fato é que todos os dias pela manhã, quando vou regá-la, tem uma florzinha muito aberta e alegre, meio vermelha, meio rosa. À noite, quando vou fechar a janela, a florzinha já se fechou e se prepara pra cair do galho. No dia seguinte, ao molhar a plantinha novamente, lá está outra florzinha nova. Pronta pra viver suas poucas horas de vida. Se alimentar do sol e depois cair ao pé da plantinha pra alimentar a terra que trará uma flor nova na planta no início do dia seguinte, que, por sua vez, cairá ao fim do dia, alimentando a planta, que dará outra no outro dia e outra no próximo e mais outra depois. E assim por diante.

Desde que percebi essa façanha de renovação da plantinha, que tem, no máximo 20cm de altura, eu me senti tão insignificante quanto esperançosa. Se um ser tão pequeno é capaz de se reinventar dia após dia, do que então eu seria capaz?

Não sei até que ponto vai a consciência da natureza, se, justamente por saber que não vai durar nem 24 horas a flor se abre e vive tão intensamente. Ou, se a sua vivacidade tem a ver com a ignorância da sua morte eminente. Não sei. Nunca vou saber. Tenho raiva de quem sabe. Apenas guardo por essa planta uma admiração que nem ela realiza. Enquanto ela deve ser da família das Fênix em forma de verde, eu observo e lhe mato a sede todos os dias. Com uma pontinha de inveja de uma planta que vive na minha janela dos fundos.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

(De)Vagar





A pé. De frente. De bicicleta. No ônibus. De dentro do carro. Na passarela. Ao corredor. Sobre a areia. Debaixo do arco-íris. Na escada. Pra cima. 

Descubro que quanto mais rápido eu quero, preciso, tenho que, desejo, procuro e tento andar mais rápido, menos rápido eu consigo andar. 

A pedra. A multidão. O cachorro. A velhinha. O subcaos. O sinal vermelho. A buzina. A poça. O asfalto. O funil. Um mendigo dormindo. O samba.

Aqui eu fico.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Longa vida???



Eu me lembro vagamente de um dia já ter ido à um Kamikase, num parque de diversão qualquer numa capital do interior. Me lembro de já ter passado o limite de velocidade. Algumas vezes. De entrar no mar a noite. Mas nem tantas vezes. Já pulei, quase sem querer, da plataforma de 5m de salto ornamental da piscina do meu colégio. Na de 10m eu também subi, mas dessa o juízo não me deixou cair. Já trepei sem camisinha. E também já morei no nono andar de um prédio. Mas isso tudo já tem tempo. Bastante tempo. Provavelmente.

Eu culparia os anos 2000 pelo meu medo. Mas a culpa não é da década de hoje, mas sim da década que nasci, pois é ela quem faz com que a década de hoje me assombre. São os anos passando. É a idade chegando. É o medo de saber que eu sou findável. E cada dia que passa, eu acredito mais nessa máxima.   

Na virada do século eu atingi a maioridade. No ano do apocalipse eu abraçarei Balzac. Esse é o apocalipse. Meu apocalipse pessoal. 

A qualquer momento eu posso entrar pra estatística de pessoas que sairam e nunca mais voltaram. Minha linha finda em algum lugar. E, depois de tanto cagar pra ela, hoje eu não faço mais o louco do tarô, colocando o pezinho pra fora do desfiladeiro. Ando encapando meu fio e não brinco nem de roda-gigante. 

É medo de não existir mais. É medo de evaporar feito água em ebulição. É paúra de ir, não voltar e ser esquecida. De deixar uma cadeira vazia na mesa. Um silêncio do outro lado da linha. E uma casa vazia. 

Dessa forma eu compreendo porque quanto mais idade mais cedo acorda-se. É o tempo se esvaindo. E a sabedoria entendendo. Que não sobra tempo. Nem pra sonhar. E eu me sentindo uma caixinha de leite longa vida. Que coalha aos poucos. Que de longa vida nada tem. Que desse mundo só levarei saudade. E deixarei saudade também. Em algum lugar. Espero.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

O doce e minha dor.



Aonde vai esse menino com esse sorvete na mão? Não sabe ele da minha dor?
Ele se concentra no doce gelado que escorre pela casquinha, cor de cacau. Seus olhos brilham sorvete.  Enquanto por dentro meu mundo desaba incolor. Não entra ar em meus pulmões e meu coração bate em slow. 
O menino degusta feliz com a língua, com os olhos, com o nariz. E eu me esforçando pra apenas continuar em pé. 
Um passo. 
Depois outro. 
Respira!  
Como pode ele estar tão infantilmente realizado se minha felicidade há pouco se desfez? 
Aonde ele pensa que vai com essa cara toda lambuzada de satisfação enquanto minha alma se afasta do meu corpo e minha tristeza dói na boca do estômago? Abusa da sua condição de menino onde seu coração ainda é apenas um órgão vital pulsando vida, na medida em que o meu não fala mais. 
Mais. 
Mais nada.