E pensar que Ele morava em muitas e em todas as coisas mais
simples. Na água gelada da bica do parque. Na grama branca de geada pela manhã.
No canto do sabiá todos os dias na mesma hora. No sorvete de chocolate com
coca-cola. Na árvore de Natal. A medida em que fui ganhando altura e idade
desentendi as coisas pequenas. E passei a procurá-Lo nas coisas maiores. Na metrópole
que não para. No mar que eu tenho medo. E Ele passou a não me fazer mais
companhia nos minutos que antecedem meu sono. Com as mãos juntas, olhos fechados
e muita fé. Quantas vezes devo ter dormido antes mesmo de dizer o Amém. Sem ser
condenada por isso. E agora. Eu não o encontro nas coisas grandes. Porque as
coisas pequenas essas já não existem mais.
Me lembro de ler num romance onde a protagonista é uma
menina de 6 anos, muito doente e prestes a morrer. Um anjinho vem lhe fazer
companhia nos seus últimos dias e os dois decidem trocar sensações e informações
sobre ser humano e ser anjo. Foi onde eu tive a melhor explicação sobre a
história de Adão e Eva:
“Quando Deus criou Adão e Eva, eles eram crianças curiosas
que trepavam às árvores e corriam pelo jardim do Paraíso que tinha sido acabado
de criar. Não faria qualquer sentido possuir um amplo jardim, se as crianças não
pudessem brincar lá. A serpente convenceu-os, então, a comer frutos da árvore
da Sabedoria e eles começaram a crescer. Quanto mais comiam, mais adultos se
tornavam. Foi assim que, gradualmente, eles foram expulsos do paraíso da
infância. Aqueles marotos estavam tão sedentos de sabedoria que acabaram por
abandonar o paraíso.”
O paraíso era o simples. O não questionado. O acreditável. A
brincadeira. O pequeno. E talvez a ignorância.
Era isso. Simples assim.
Deus existe na infância. E hoje eu tenho saudades de Deus.