Depois de ter criado todo o universo e sentindo-se solitário, sem ninguém nem pra colocar defeitos na sua imensurável invenção, Deus resolveu criar o homem. Ainda insatisfeito e no intuito de se divertir um bocado, Deus, então, criou o amor. O homem, inebriado com aquela nova sensação, não se deu conta que entrava num caminho sem volta.
(...)
Eu tinha uns 12. Talvez sequer tinha experimentado um beijo de língua. Fábio era o nome dele. Nem me dava muita moral. Por ser repetente, me considerava uma pirralha. Era meio malandro, vivia sendo suspenso, colocava apelido nos professores, escrevia palavrões no quadro negro a cada intervalo de aula. E era gato. Muito gato. E eu, só uma menina que escondia a timidez atrás dos óculos de grau. Sinceramente, não tenho idéia do porquê, só sei que de repente ele me olhou diferente. Me escreveu um bilhete. Implicava comigo. Me elogiava. Foi o primeiro ser do sexo oposto que me deixou sem-graça. Um dia, ao final da aula, havia um burburinho muito grande na porta de saída do colégio. Vieram me buscar. Me levaram até o viaduto que ficava ao lado do colégio. A escola inteira estava lá. Eu fui, sem entender nada. Nada. As pessoas diziam "É pra você! O Fábio fez pra você!" Nada. No curto caminho da escola até o viaduto, eu não entendia nada. Quando cheguei todos ficaram me olhando, cometando. E nada. Eu não entendia. Até que olhei pra parede recém-pintada de cinza e reclinada debaixo do viaduto. Em letras garrafais, pixadas em preto, as 3 palavras: TATI TE AMO. 10 segundos sem ar. 10 segundos sem chão debaixo dos meus pés. Ele tava lá. O que eu fiz? Pulei no seu pescoço??? Não. Absolutamente. Só consegui virar as costas e correr até o ponto de ônibus. Fui pra casa. A sensação que eu sentia era de medo. Muito medo!! Aquilo era muito novo pra mim e eu tinha medo!! (Eu era inteligente e não sabia!) Só sei que fugi daquilo. Pra sempre. Nós nunca ficamos. Todas as vezes que alguém tocava no assunto eu, prontamente, mudava o rumo da prosa. Todas as vezes em que eu passava debaixo daquele viaduto, de carro ou de ônibus, eu olhava praquelas 3 palavras. Com medo. Aos poucos eu vi outras palavras e desenhos sendo acrescentados ali. Outras pixações, outras inspirações. E quanto mais eu via aquelas palavras desaparecerem, mais aliviada eu me sentia. Eu gostava dele. Eu sonhava com ele. Meu coração acelerava por ele. Mas eu nunca tive coragem. Se eu me arrependendo? Às vezes. Mas tão às vezes quanto quando eu penso que deveria ter continuado com medo. Assim eu jamais teria vivido as tristezas recorrentes. Mas também nunca saberia a delícia e a sensação indescritível que é a de amar e ser retribuida na mesma intensidade. O ser humano é movido pelo sentimento, seja ele de ódio, tristeza ou amor. Meu amor não muda. Eu nunca esperei por uma declaração impressa nos muros ou numa jóia 18 quilates. Também não acredito em príncipes e nem em fidelidade vitalícia. Eu acredito na velocidade do meu batimento cardíaco. E já que eu entrei nesse caminho sem volta, mesmo tendo resistido na primeira oportunidade, eu não tenho saída. O que eu espero disso tudo? Que o outro compreenda o meu amor. E só.
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Embora eu saiba que, nos dias de hoje, seria mais fácil esperar pela jóia.
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