Eu não me lembro com exatidão do momento em que deixei de
acreditar em Papai Noel. Também não me recordo de quando entendi que heróis eram
feitos apenas de excesso de imaginação. Mas sei do dia, hora e minuto em que
compreendi que nada, absolutamente nada, dura pra sempre. Ontem, exatamente
ontem, um click me abriu os olhos ao mesmo tempo que os encheu de água. Nada dura
pra sempre. Não atuarei na minha profissão para todo o sempre. Ela me
decepciona, na maioria das vezes. Não serei capaz de amar alguém pra sempre, ao
passo que também não serei amada pra sempre. Nem mesmo pela minha mãe. Porque um
dia, não mais que de repente, ela será levada desse mundo, e como desconheço o
mundo do lado de lá e nem sei sequer se de fato ele existe, muito provavelmente
ela ficará apenas na memória. E memórias não amam. Muito menos pra sempre. A própria
memória um dia se esvairá. Se desbotará aos poucos até sumir pra sempre. Minha beleza
durará apenas mais alguns anos. Meus livros preferidos serão comidos por
traças. Meus cds, que contam pedaços da minha história através de fotos e vídeos
ali gravados, um dia serão lixo reciclável. Minhas palavras serão
esquecidas. Meus amores já têm outros
amores. Porque não seria imortal posto que é chama. Minhas músicas não atravessarão
gerações. Minha casa precisa ser outra. E assim por diante. Um dia eu cheguei
sim a acreditar que tudo era pra sempre. E não faz muito tempo. E eu era feliz
assim. O que eu não sabia era que o pra sempre sempre acaba. Mas está tudo bem. Meu medo não será pra sempre e eu também não vou durar pra sempre. E quando o
fim da minha estrada chegar nada disso terá mais importância.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
sábado, 13 de novembro de 2010
Amar é...
Um dia ela me olhou com aqueles olhos azuis de safira e perguntou
minha idade. 18, disse eu. Ela sorriu, meio amarguradamente, dizendo: “eu tenho
28, dez a mais que você. Aproveite enquanto você ainda tem a capacidade
absoluta de amar. Amar pura e incondicionalmente. Ao longo do tempo você vai
passando por coisas e sua forma de aplicar o amor vai mudando. Quando você chegar
à minha idade você vai ver viver o amor de maneira diferente”.
Dez anos se passaram e eu cheguei à idade dela. E ela tinha
toda razão. Ou não. Amar aos 18 é achar que aquela pessoa é amor pra vida
inteira, pra ter netos e passar os últimos dias da vida na varanda da casa,
cada qual em sua cadeira de balanço. É não conseguir se imaginar sem a razão da
sua inspiração pra escrever cartas ou passar um fim de semana inteiro chorando porque
foi obrigada a viajar com os pais deixando o ser amado pra trás. Amar aos 28 é
saber que o buraco é muito mais embaixo e que, provavelmente, se teve começo
terá fim. E, que não necessariamente isso seja melhor ou pior. A razão de minha
colega de questões amorosas de 10 anos atrás mora na sua colocação de que, com
o passar do tempo, vamos transformando a maneira de aplicar nosso amor. Me perguntei e te perguntei outro dia se eu de fato amo ou
se é só uma ilusão produzida pelo meu coração a partir de uma solidão momentânea.
Será que amamos uma única vez na vida, antes dos 18 até, e a partir disso tudo
é apenas uma tentativa de reviver ou esquecer ou substituir aquilo? Rodriguianamente
falando, se acaba é porque não era amor. Já o poetinha escreveu as mais
comoventes e belas poesias sobre o amor, mas se casou diversas vezes. Se pra
toda regra existe uma exceção, pra cada amor existe uma regra. E pra cada uma
dessas regras existe um amor. Antes fosse tipo receita de bolo. Mas por
enquanto, a gente vai vivendo 18, 28, 58, 98 anos tentando entender e viver e
sobreviver ao amor.
sábado, 6 de novembro de 2010
Um, dois, três, testando.
Até quando serei testada? Até quando serei posta à prova? Até
onde precisarei ser examinada?
É normal se sentir um camundongo branco de laboratório? Como
se você fosse eterna e diariamente testada pra continuar sobrevivendo na
sociedade? Pra conseguir um trabalho minutos ou dias de testes de habilidade e
beleza. Pra se relacionar alguns dias ou semanas de test drive. Pra alugar
alguns metros quadrados de teto pra morar uma meia dúzia de comprovantes. Pra
ser aceito nas rodas de amigos uma ou outra piada seguida de uma lambida de
saco. Diploma? Só depois de responder as 1.348.294 perguntas.
Abre a boca, coloca a língua pra fora e diga AAAAAAAAAAAHH! Diga
trinta e três. Coloca o pé direito nas costas. Sabe cantar? Tem alergia a algum
medicamento? Tem problema de vista? Improvisa essa cena. Dança? Anda à cavalo? Fala javanês? Leu o horóscopo
hoje? Estica as pernas e mais tônus no abdômen. Comprovante de renda, por
favor. É hetero? Prefere chocolate preto ou branco? Usa-se os talheres na ordem
de fora pra dentro. Não ande descalça, é falta de higiene. Testeee. Som. 1, 2,
3, som. Sssssom.
Não é bonita o suficiente. Alta de mais. Alongada de menos. Sotaque
sulista não rola. Botafogo não é um bairro bom. Renda insuficiente. Passou o
prazo. Cachos de mais. Peitos de menos. Não sorria tanto. Dentes demais. Fala mais baixo que
isso aqui não é teatro.
Segura a claquete. Tati Pasquali. 28 anos. 1,68m. Sorria.
Vira pro lado direito. Vira pro lado esquerdo. Da uma volta completa. Da o
texto pra essa parede. Corta! Valeu! A gente entra em contato.
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
Por onde andará?
Ela anda largada às traças. Eu já gritei, mas ela insiste em não ouvir. Ficou surda. Voz então ela nem se lembra mais se era soprano ou cicrano. Os dois olhos negros ela pisca com força e faz bico. Dá de ombros pra minha impaciência. Bate o pé no chão feito criança. Consegue, por mais incrível que pareça, ser mais teimosa que a mim. Ela senta na minha frente, num canto qualquer, e me olha como se fôssemos duas entranhas. Quando eu tento puxar um assunto ela a mostra língua, sai correndo, pára, faz uma banana pra mim e morre de rir. Quando eu acho que ela vai dar o ar da graça ela boceja na minha cara e pega num sono profundo. Não quer saber de mim. Ela não gosta mais de mim. Mal sabe a tipa que dela preciso. Que minha sanidade mental e psicossomática dela dependem. Desaforada. Ah! Se eu vir por aí, rondando meu quarto e me provocando pra depois sair fugida pelo ladrão, eu a pego pelo braço, a coloco no colo e dou palmadas até ela pedir água e prometer que vai coloborar. Safada. Mas você vai voltar que eu bem sei. Mas vê se não fode meu pavil que de curto já quase explodiu. Até rimou. Viu? Ei? Ficou orgulhosa? Inspiração??? Por onde andará a porra da minha inspiração????
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