Hoje, as 13h, como de costume nas tardes livres, coloquei a tv no canal 43 pra assistir a mais um episódio do seriado que eu aprendi a adorar: House. E hoje eu não ri das suas ironias, não me irritei com suas grosserias e nem o aplaudi internamente por sua genialidade. Hoje eu vi, pela primera vez, o lado humano desse personagem polêmico.
Pra resumir o episódio. Ele sofre um acidente de ônibus e perde a memória recente. A única coisa que ele sabe é que alguém está prestes a morrer e ele precisa salvar aquela vida, por uma razão que ele desconhece. Aos poucos, à base de remédios e de eletricidade enviadas ao seu hipotálamo (região do cérebro responsável pela memória) ele vai se lembrando do acontecido. Por que ele não tem limites. Isso é da sua personalidade. Mas ele começa arriscar de verdade a sua vida por aquelas lembranças quando ele descobre que a pessoa a ser salva é a mulher do seu melhor amigo, Wilson, que estava com ele no ônibus. Obviamente ele a tratava com todo o desprezo do mundo. Mas sabe-se que no fundo (e nem tão no fundo assim) ele gostava dela. Ele precisava saber o que aconteceu antes do acidente. Pois não era apenas o acidente que estava matando Amber. Ela tinha sintomas que revelavam algo mais. E ele, e sua equipe genial de investigadores, desvendam o mistério. Mas ela não tem saída. Nada pode ser feito. Ela vai morrer. E, pela primeira vez na vida, ele não segue só aos seus instintos. Porque dessa vez ele ouve a opinião de Wilson. Aquela mulher à beira da morte não é uma paciente qualquer. É a mulher que faz o melhor amigo dele feliz. Depois de tantas investidas afim de recuperar sua memória, Dr. House tem sucesso, mas sofre um infarto e depois entra em coma. Não antes de dizer ao seu amigo que sente muito. Que nada mais pode ser feito por ela. Cuddy, a chefe do hospital dá à Wilson a oportunidade de se despedir de sua mulher. Ela vai morrer. Mas ela pode ser reanimada. Pra viver algumas horas. E assim é feito. Ela volta. Wilson lhe dá a notícia. Os colegas vem pra se despedir. E nos últimos momentos de sua vida, Wilson não sai do seu lado. E assim ela parte. Com o seu amor abraçado à ela, numa cama de hospital, dizendo o quanto a ama. Minutos antes da morte, ele pergunta à ela: "Como você pode estar calma? Não sente raiva?" Ao que ela responde: "Raiva não é a última coisa que quero sentir!" E vai. Fecha os olhos e vai. Em seguida, vemos o que todos os seus colegas de hospital fizeram depois daquilo. Um dos novos assistentes de House chega em casa e abraça sua mulher como talvez nunca havia feito em toda sua vida. Wilson chega em casa e acha um bilhete dela que dizia: "Desculpe não estar aqui, fui buscar House." E assim por diante. Eu terminei de ver o episódio com a cara inchada de tanto chorar, pensando: "Como você se despede de alguém assim, sabendo que nunca mais irá vê-lo? Como você deixa a vida te levar alguém tão jovem, alguém com quem você tinha planos? Casa, filhos, uma vida?!?!?! Por que essas coisas não podem ser previstas e evitadas?" Fiquei alguns minutos meio em transe. Não conseguia parar de chorar.
Peguei minha toalha pra tomar banho, mas antes passei pelo computador e li uma mensagem de uma grande amiga que dizia: "uma tragédia aconteceu Tati... meu pai faleceu ontem... to atordoada... sem
rumo, sem chão, sem nada..."
Segundos em apnéia.
Peguei o celular e fiz um interurbano. Minha amiga, o que aconteceu? E foi isso. Sem aviso prévio. Sem uma previsão. Sem dó. O pai da minha amiga. Assassinado. Tiraram o pai da minha amiga. Liguei pra não dizer nada. Porque eu não sabia dizer nada. Eu ouvia seu choro e chorava junto. Por que tem que ser assim? Eu conhecia muito bem a relação daqueles dois. E nunca vi cumplicidade igual, carinho igual. Um amor incondicional. Cheguei, por vezes, a sentir uma certa inveja daquela relação pai e filha. Eu conhecia aquele homem. Que era de uma doçura sem fim. E de um nome lindo. Já pensei muito em dar aquele nome ao meu filho. Não por causa do cantor. Mas por causa do pai da minha amiga. Tiraram ele da minha amiga, da família deles, das netas que nasceram há pouco mais de um ano. E esse caso foi muito diferente do primeiro. Eles não puderam se despedir. A última vez que ela o viu com vida ela nem sequer sabia que seria a última vez. A última vez que eles se falaram, não era a última vez pra ela. Nem pra ele, suponho.
E, se não temos o dom da adivinhação, como saberemos que será a última vez que veremos alguém? Como saber que a última vez que encontramos alguém querido e que não o tratamos como deveríamos ter tratado, se não o dissemos o quanto o amamos e o quão importante ele(a) nos é, foi de fato a última chance que tivemos? Como podemos ter a audácia de desdenhar alguém pensando em talvez se redimir numa próxima vez se a próxima vez pode não existir????
O destino muitas vezes é cruel, mas, pensando bem, nós humanos somos um pouco mais...
Nós somos feito máquina. A qualquer momento um fiozinho pode se desligar do outro e fazer a máquina parar de funcionar. Um motorista alcoolizado pode cruzar nosso caminho. Um simples tropeção no box do chuveiro. Uma intoxicação depois de um almoço de família. A violência urbana. Muita gente que sai de casa e não volta. São tantas as possibilidades pra um único fim. Todos nós partiremos um dia. E não há como prever que dia será esse. E pior do que partirmos um dia, é saber que alguém que amamos muito partirá antes. Deixando um cadeira vazia na mesa de jantar. Um silêncio na hora do gol. Uma ausência de abraço. Um número de telefone na agenda sem ninguém pra atender do outro lado. Uma metade vazia na cama. Aí você vai se perguntar: Por que eu não disse que a amava com toda minha alma? Por que eu não o levei pra ver o Sol se pôr ao menos uma vez? Por que eu não larguei tudo numa tarde de segunda-feira pra levá-la pra um pique-nique no parque? Por que eu não lhe fiz uma surpresa no último aniversário? Serão tantas a perguntas pra tentar entender o porque nosso orgulho ou nossa "falta de tempo" é maior do que o nosso amor que depois disso só mesmo torcendo pra que Chico Xavier estivesse certo. Porque, no fundo, acreditar em vida após a morte é mais uma maneira de suscitar a esperança de que um dia encontraremos novamente as pessoas que perdemos.